segunda-feira, 20 de junho de 2016

MORTOS E MARTAS...

Pr. Raul Marques
Uma das mais fantásticas passagens bíblicas sobre a valorização da vida está relacionada também ao poder restaurador de Jesus Cristo: o caso da ressurreição de Lázaro. Jesus tem a vida em alta conta. Para ele todas as pessoas têm importância vital. Há vida em toda a criação de Deus.
Jesus Cristo tinha motivos muito pessoais para nutrir amizade e amor muito especiais pela casa de Lázaro. Ali Ele daria lições de verdadeira adoração ao Senhor. Ali Ele daria instruções sobre as coisas que realmente importam à vida humana. Na casa de Lázaro Jesus nos cumularia de sábios conselhos sobre a vida e a morte; sobre a morte e a ressurreição; sobre o valor da vida e a importância da morte. Certo dia Jesus foi à casa de Lázaro e se deparou com duas mulheres preocupadas em lhe oferecer o melhor que podiam. Ele lhes fez lembrar que o melhor que elas tinham estava na alma e não nas iguarias ou na fartura da mesa. Ele percebeu o quanto Marta era preocupada com as tarefas domésticas, através das quais cria que mais plenamente agradaria o Mestre. Ele viu também que Maria, irmã de Marta, tinha muita satisfação em recebê-lo em sua casa, mas a sua dedicação estava direcionada para ouvir os seus ensinamentos, diferentemente de Marta que corria freneticamente de um lado para o outro, preocupada em como agradá-lo socialmente.
Reflito hoje este quadro bíblico com os olhos postos no nosso modo de vida atual. O amor e a amizade de Jesus por Lázaro, Maria e Marta, são os mesmos nutridos por nós, por cada uma das nossas famílias. Ele sabe também das nossas inúmeras inquietações, da nossa tendência à adesão às preocupações com este mundo. Ele percebe que muitos de nós, em nossas casas, estão correndo tanto que nenhum tempo nos resta para adoração, para oração e para comunhão. Ele percebe que somos mais preocupados com a quantidade que com a qualidade das coisas que temos. Ele sabe, inclusive, que nós temos muito desejo de agradá-lo, mas temos agido sempre da maneira mais inconsequente, contradizendo nos atos aquilo que afirmamos com palavras.
A morte de Lázaro foi tão profundamente dolorosa para Jesus quanto para Marta, Maria e todos os amigos da aldeia onde eles residiam. Quando lhe avisaram da morte de Lázaro Ele sofreu por elas, pois conhecia bem os sentimentos humanos, sobretudo com as perdas. Antes, porém, de dirigir-se para a aldeia de Marta e Maria, decidiu atender outros necessitados, demorando-se por dois dias em Betânia, do outro lado do Jordão, onde João havia batizado. A aparente demora de Jesus é sempre um tormento a mais para os que sofrem e parecem ter perdido as esperanças. No entanto, a Bíblia nos afirma que Ele é o nosso “socorro bem presente na hora da angústia” Salmo 46:1.
Quantas vezes nos encontramos na vida em meio a “mortos e Martas”, mergulhados numa atmosfera de tristezas e lutas; de dúvidas e dificuldades? Quantas vezes somos sacudidos pelas perdas irreparáveis; pelo luto; pelo vazio; pela solidão e até pela descrença? Por quantas vezes temos visto os nossos sonhos perecerem, em virtude de não termos dado importância àquilo que realmente merecia? Quantas vezes temos agradado à pessoa errada, errando o alvo? Quantas vezes temos nos matado fazendo coisas que nunca agradarão ao Senhor, omitindo aquelas que verdadeiramente Lhe satisfariam?
Certa vez Jesus chamou alguém para segui-lo e obteve a seguinte resposta: “Senhor, deixa que primeiro eu vá a enterrar meu pai. Mas Jesus lhe observou: Deixa aos mortos o enterrar os seus mortos; porém tu vai e anuncia o reino de Deus” Lucas 9.59-60. Não devemos nos preocupar com nada daquilo que foge ao nosso controle, nada conseguiremos fazer naquilo que somente o poder de Deus pode agir. Uma coisa é certa: se temos estado feito “mortos”, sem sentimentos, inertes, já cheirando mal; ou agido feito “Martas”, correndo de um lado para outro, sem consciência daquilo que realmente pode agradar a Deus, é hora de clamar a Deus para que nos ressuscite: que faça rolar a pedra do nosso túmulo existencial, e nos permita sair e ver a luz da vida outra vez.

segunda-feira, 13 de junho de 2016

CICATRIZES...

Pr. Raul Marques

Toda maldade produz cicatrizes. Toda ferida pode, com o tempo, cicatrizar. Todas as marcas deixadas, porém, são partes da história de cada um e muito dificilmente não nos trarão a lume os seus significados. Não podemos dizer que nunca deixaremos de lembrar a intensidade da dor que produziram aquelas marcas. Lembraremos sim, pois elas estão ali, na pele, tatuadas e prontas a responder com o silêncio a profundidade e o significado da sua existência. Entretanto, são elas também que sinalizam pra nós, que são cicatrizes presentes de uma dor passada...
O intenso sofrimento de Jesus Cristo marcou o seu corpo e a sua alma tão profundamente que não seria razoável supor que não houvessem deixado sinais. É claro que Jesus perdoou os seus algozes; Ele se expressou a respeito disso em meio ao seu desvairado sofrimento: “Pai, perdoa-lhes, pois eles não sabem o que fazem” Lucas 23.34; no entanto, tivesse Jesus permanecido entre nós vivenciando por muitos anos a crueldade do nosso coração, certamente que todos veriam as suas cicatrizes expostas apontando para um martírio vivido. Um grande exemplo disto está estampado no diálogo que Jesus teve com Tomé. As marcas em Jesus ao serem tocadas por Tomé tiveram o poder de transmitir-lhe verdade, perdão e muito amor.
As cicatrizes podem ser ao mesmo tempo a prova do sofrimento e a marca da necessidade do perdão. Se olharmos para as nossas cicatrizes com sofrimento e ódio, certamente estaremos alimentando a sangria em feridas que teimarão em não sarar. Por outro lado, se fitamos as nossas marcas como sinais da possibilidade do perdão e da felicidade anelada, não podemos negar a óbvia presença do Espírito Santo de Deus em nossas vidas, ajudando-nos a entender que “todas as coisas concorrem para o bem daqueles que amam a Deus; daqueles que são chamados segundo o seu propósito” (Rm 8.28).
Todos nós temos algumas cicatrizes. Importa-nos saber o que fazemos delas; com que motivação elas se evidenciam em nós. O que será que elas tendem a nos lembrar? É bom não esquecermos a recomendação bíblica: “a boca fala do que está cheio o coração” (Lc 6.45).