O COMPLEXO DA CENTÉSIMA OVELHA
É notícia recorrente no meio evangélico o fato de ovelhas desgarradas do
rebanho virarem turistas da religião. O pior disso tudo é que a ovelha por
onde passa dissemina a ideia de ter sido abandonada, completamente largada e,
por isso mesmo, está às soltas buscando encontrar um novo aprisco.
O texto de Lucas 15.4-7 revela-nos duas belas
imagens que poderão perfeitamente ilustrar e explicar esse fenômeno do
comportamento religioso. Primeiro, o evangelista faz arguição à liderança do
rebanho: “Que homem dentre vós, tendo cem ovelhas, e perdendo uma delas, não
deixa no deserto as noventa e nove, e não vai após a perdida até que venha a
achá-la?”.
Certamente que nenhum pastor se compraz com o
abandono de qualquer de suas ovelhas. É natural que o pastor sinta a falta de
qualquer de suas ovelhas no rebanho e seja capaz de “deixar” noventa e nove
daquelas cem a fim de alcançar o retorno daquela que está desgarrada. Mas é
bastante significativo notar que o texto não deixa qualquer dúvida sobre o
estado em que se encontra a centésima ovelha: ela é o arquétipo de um pecador
arrependido. Informa-nos o texto: “Digo-vos que assim haverá alegria no céu por
um pecador que se arrepende, mais do que por noventa e nove justos que não
necessitam de arrependimento” (Lc 15.7).
Infelizmente não é o que costumeiramente vemos
ocorrer nos apriscos: arrependimento. Ao contrário, vemos muito orgulho,
vergonha, ressentimento, e o que é pior: atribuição de culpa ao pastor que no
mais das vezes é o último a saber das causas, sendo sempre o único a tentar
minimizar as consequências. Deve o pastor ser bíblico no tratamento das suas
ovelhas, mas não poderá jamais compactuar com mimos e vaidades pessoais que
levem ao comprometimento de todo o rebanho. Parece-nos que muitos sentem prazer
o complexo da centésima ovelha: impactar a vida do pastor e causar desassossego
nas noventa e nove que terão que suportar a dureza do deserto... Que o Senhor
tenha misericórdia de todos nós!
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