segunda-feira, 26 de julho de 2021

                                                   O BOM PASTOR...

Pr. Raul Marques
 “Eu Sou o bom pastor. Conheço as minhas ovelhas e sou conhecido por elas...” João 10.14


N
ão há situação mais prazerosa e mais reconfortante do que ser reconhecido como quem você realmente é; nem mais, nem menos. É muito agradável conhecer pessoas e, igualmente bom, é dar-se a conhecer por elas. Eu penso que Jesus tinha isto em mente quando, enquanto humano, conheceu o universo dos humanos ao mesmo tempo em que se deu a conhecer por ele. Viu de perto as suas fraquezas e as suas virtudes ao mesmo tempo em que lhes mostrou suas dores mais profundas, a solidão, a angústia e até o seu limite: passa de mim este cálice...”.
Jesus ensinou que devemos amar as pessoas do início ao fim da nossa jornada, conforme demonstrou em João 13. Isto não é fácil e nem é simples, pois, requer abnegação, renúncia do ego, consideração pelas fraquezas do outro, e, sobretudo, um conhecimento maduro e compatível de si mesmo.
Lembro-me agora de um poema que escrevi quando tinha mais ou menos dezoito anos onde, tomado pelo sentimento da dureza da existência humana, expus: eu muitas vezes quero ser um bicho pra pelo menos ir viver em paz.... A humanidade é, ao mesmo tempo, linda e dramática; singela e complexa; necessária e deletéria! Somente agora, na idade madura, torna-se possível mensurar o que tantas vezes ouvi dos mais velhos quando em criança: É mais fácil criar galinhas que lidar com gente!”.
A responsabilidade pastoral muitas vezes se confunde com a incumbência paistoral – um neologismo agridoce... Quem se nega a disciplinar e repreender seu filho não o ama; quem o ama de fato não hesita em corrigi-lo Pv. 13.24. Ocorre que nem sempre é possível corrigir uma ovelha como a um filho... Há filhos dóceis e ovelhas indomáveis.
Quando o Senhor Jesus afirmou: Eu conheço as minhas ovelhas, Ele sabia perfeitamente do que estava falando – Tu formaste o íntimo do meu ser e me teceste no ventre de minha mãe Salmos 139.13. Quando, porém, disse: e sou por elas conhecido, estava evidenciando muito mais sobre a Sua capacidade de se deixar conhecer do que da sinceridade dos que poderiam tê-lo conhecido melhor e mais adequadamente. Porventura, não é esta uma descrição assemelhada entre as pessoas da igreja e o pastor? Este tem a obrigação de conhecer e tratar as feridas e as insanidades daquelas; aquelas, quase sempre, nunca sabem discernir quando ele padece ou carece da compreensão, da sensatez e do abraço...
Realmente, jamais poderia ter sido formado do pó aquele que levaria sobre si os pecados do mundo... Era preciso ter nascido por obra do Espírito Santo! O coração pastoral tem mais de materno do que de si mesmo. Ser pastor não é uma escolha nossa, pessoal, antes pelo contrário, é obra exclusiva de Deus: é chamado, do qual não se pode arredar e discrepar. Ser pastor é viver uma luta diária e renhida contra a sua natureza do άνθρωπος (homem).
Dá-nos forças, Senhor, para que sejamos semelhança do teu Filho, Jesus Cristo, e não nos cansarmos de amar até o fim; para que saibamos conhecer as ovelhas que nos tem confiado e para que sejamos por elas conhecidos. Dá-nos sempre a mesma força da humildade e mansidão dadas ao Teu Santo Filho que, imerso no mais agudo da dor da traição e da incompreensão, clamou: Pai, perdoa-lhes, pois eles não sabem o que fazem!. Dá-nos a alegria e a dignidade de nos sentirmos como Jesus ao ouvir de Ti: Este é o meu Filho muito amado, em quem eu tenho prazer!. Livra-nos do desejo de vingança, pois ela a Ti pertence. Livra-nos de devolver as pedras lançadas. Dá-nos o gozo permanente de simplesmente saber introjetar a Tua promessa: Bem-aventurados sois vós quando vos insultarem, e perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós, por minha causa. Exultai e alegrai-vos sobremaneira, pois é esplêndida a vossa recompensa nos céus; porque assim perseguiram os profetas que viveram antes de vós Mateus 5.11-12.     

sexta-feira, 9 de julho de 2021

 EU TENHO MEDO...

Pr. Raul Marques

 


              Quando criança eu tinha muitos medos! Medo das muitas águas; do escuro intenso; das portas fechadas com trancas; do “lobisomem”; do “velho do saco”; da “bruxa malvada”; enfim... Na medida em que fui crescendo outros medos foram sendo acrescentados: medo de matemática; medo das confusões e das multidões; medo de ser chamado ao quadro negro, etc. A grande maioria deles foi superada pela razão e pela maturidade; outros, no entanto...

           O medo é um sentimento profundamente complexo como a nossa própria existência! Ele é bom, enquanto sinal de alerta, e mal, se se tornar patológico. Ao longo da nossa vida outros medos vão se associando à caminhada e vão nos mostrando mais nítidas certas obscuridades... Eles nos ajudam na nossa proteção pessoal, ao mesmo tempo em que podem proteger as outras pessoas de nós...

         O medo não pode ser considerado um ato de covardia quando servir de motivação para o exílio contra as forças da impiedade! Ele pode, perfeitamente, se constituir no canal mais legítimo a nos levar aos “getsêmanis” em busca de paz.

           Eu tenho medo do “homem”! Não é sem motivo que a Bíblia vaticina: “Maldito o homem que confia no homem, que faz da carne mortal o seu braço e aparta o seu coração do SENHOR!” (Jr 17. 5). Eu tenho medo dos “falsos irmãos”, de quem o apóstolo Paulo fez menção (II Cor 11.26). O apóstolo teve tanto receio deste aspecto que, angustiado, foi além: “agora vos escrevo para que não vos associeis com qualquer pessoa que, afirmando-se irmão, for imoral ou ganancioso, idólatra ou caluniador, embriagado ou estelionatário. Com pessoas assim não deveis, sequer, sentar-se para uma refeição” (I Coríntios 5.11).

          Tenho medo do que Jesus profetizou sobre esses fatos difíceis: “Naquele tempo muitos ficarão escandalizados, trairão e odiarão uns aos outros, e numerosos falsos profetas surgirão e enganarão a muitos. Devido ao aumento da maldade, o amor de muitos esfriará” Mateus 24.10-12. Tenho medo que as decepções resultem em apatia ou, ainda pior, em antipatia às atividades do exercício da fraternidade legítima, sobretudo, quando ouço a voz do Mestre a ressoar: “Quando, porém, vier o Filho do homem, porventura achará fé na terra?” Lucas 18:8b.

         Tenho encontrado tanta gente ferida, enganada, desiludida e frágil com as deformadas relações cristãs, que falta-me o fôlego... Conheço líderes abandonados do mesmo modo como conheço ovelhas nanicas e desnutridas clamando por amor e acolhimento. Tenho medo do tempo em que vivo. Por isto, Senhor, tem misericórdia de todos nós! Tenho saudades dos medos de quando criança... Já não sinto aquele medo ingênuo do escuro da noite; tenho medo, muito medo, das densas trevas da mente e coração humanos...